P: Valentim ou Pinto da Costa nunca lhe disseram para controlar o que Ricardo Costa (presidente da Comissão Disciplinar da Liga) andava a fazer?
R: A única pessoa que me falou do Ricardo Costa foi o Adelino Caldeira, vice-presidente do FC Porto, a 3 de Setembro de 2008 num almoço no restaurante Lusíadas, em Matosinhos. Ele foi clarinho e apreciei a frontalidade. Disse-me: ‘Meu caro, ou você corre com o Ricardo Costa e tem a vida facilitada ou vamos fazer-lhe a vida negra’. Certo é que não mudei a orientação de total autonomia que dei desde o início à Comissão Disciplinar. Desde esse dia que percebi que me iam fazer a vida negra e fizeram.
P: Por que queria o Porto afastar Ricardo Costa?
R: Tem a ver com as decisões disciplinares do Apito Dourado, como é evidente. Mas, em nenhuma circunstância, o presidente da Liga podia destituir este ou aquele. O Filipe Soares Franco, presidente do Sporting, também várias vezes sugeriu que eu substituísse o Vítor Pereira – que é a pessoa que mais percebe de arbitragem em Portugal. Não sei se o futebol português está preparado para a autonomia que eu decidi. Porque o presidente da Liga é fustigado por todos (por dirigentes, por especialistas de tudo e coisa nenhuma, por comentadores de segunda e terça-feira) sobre matérias sobre as quais não tem a mínima responsabilidade.
P: O que aconteceu depois dessa conversa com o Adelino Caldeira?
R: Essa conversa foi tida num registo de grande urbanidade. Mas a partir desse momento aconteceram coisas absolutamente artificiais como a novela da entrega do troféu de campeão que levou o Porto a escrever uma carta ao secretário de Estado do Desporto a fazer queixa da Liga. O barulho que fizeram! Quando se sabe que esteve marcada a cerimónia – combinada por Óscar Fernandes, funcionário da Liga, que tratou tudo com o FC Porto – e que essa entrega não foi feita porque Pinto da Costa tinha casamento marcado com a senhora Filomena. Obviamente, se o presidente do Porto não estava presente, a Liga não ia fazer essa entrega. E Tiago Craveiro, secretário-geral da Liga, várias vezes falou com Antero Henriques (director do FC Porto) para tentar marcar uma data para a entrega do troféu, mas nunca havia disponibilidade. Criou-se a ideia de que a Liga não queria entregar o troféu ao Porto – isto cabe na cabeça de alguém?
P: Quando entregou a taça, deve ter ouvido a maior assobiadela na sua vida…
R: Depois de toda a intoxicação que foi feita, não esperava outra coisa. Recordo-me de que os funcionários do Porto foram de uma correcção extraordinária. Mas lembro-me também que, quando saí da sala para entregar o troféu, ouvi um diligente funcionário do Porto a dizer: ‘Desliguem a musica! Desliguem a musica!’. Era para se ouvirem melhor os assobios. Nunca vi entregar um troféu sem música. Foi original. Foi claramente uma história montada para criar problemas e desgaste, para fazer com que eu não fosse entregar o troféu. Para depois me acusarem de lá não ter ido. As pessoas conheciam-me mal.
R: São matérias sobre as quais não gosto de me pronunciar. São coisas do foro pessoal. Apenas quero dizer que nunca tive segurança pessoal.
R: Não sou inimigo de ninguém. A partir do momento em que o presidente do FC Porto me deixa de mão estendida numa tribuna num jogo no Estádio do Algarve entre o Porto e o Sporting, é evidente que as relações pessoais não podiam ficar da mesma forma. A falta de educação fica com quem não retribui um cumprimento. Mas essa circunstância em nada criou dificuldades no relacionamento institucional entre a Liga e o Porto. Alias, o clube participou activamente e de forma construtiva em todas as reuniões de trabalho. Uma coisa é a relação Hermínio Loureiro/Jorge Nuno Pinto da Costa; outra coisa é a relação Liga/ FC Porto. Em circunstância alguma o Porto podia ser penalizado.
P: Demitiu-se em Março, quando o Conselho de Justiça decidiu reduzir a suspensão aplicada pela Liga a Hulk e a Sapunaru. Não acha que acabou por dar razão a quem o queria ver pelas costas?
R: Assumi as minhas responsabilidades. Não sendo jurista, entendi como uma enormidade a desproporção dos castigos aplicados aos jogadores Hulk e Sapunaru pela Comissão Disciplinar e pelo Conselho de Justiça. Não podemos confundir três jogos com quatro meses. Não estou aqui a dizer quem é que decidiu melhor. Deveria ter havido mais cuidado, porque a desproporção das decisões coloca em causa o trabalho de credibilização do futebol. Era preciso alguém tomar uma atitude.
P: A sua demissão foi um murro na mesa?
R: Foi um grito de revolta.
P: Não era mais lógico demitir-se Ricardo Costa?
R: Não. Se alguém tinha que se demitir, era eu. Nesse dia almocei com Pedro Passos Coelho na Mealhada e ia para Vagos para uma acção de campanha interna para a liderança do PSD. Sabe quem é que me ligou a dar nota da decisão do Conselho de Justiça?
P: Quem?
R: Não imagina. Foi Jorge Nuno Pinto da Costa. Fez questão de ligar-me para dizer qual tinha sido a decisão do Conselho de Justiça. Esta é a parte que posso contar desse telefonema.
P: Depois de o deixar de mão estendida, ligou-lhe para lhe comunicar a sua vitória no Conselho de Justiça. Você ainda não sabia de nada?
R: Não. A decisão deveria ter sido tornada pública naquele preciso momento. Não estou com isto a dizer que o presidente do Porto tivesse tido acesso a ‘inside information’. Estava dentro do carro, e recebi um telefonema de um número que não tinha gravado. Atendi e ouvi: “Daqui fala Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do FC Porto”. E transmitiu-me a decisão do Conselho de Justiça e depois disse-me um conjunto de coisas que não posso tornar públicas.
P: Porquê? Não são reproduzíveis?
R: Não posso, não devo. Sei o que é publicável e transmissível, e o que não é. A partir desse momento, procurei confirmar a informação, pois havia muita contra-informação a circular – a RTP chegou a noticiar uma coisa à hora de almoço que não se veio a confirmar. Mais tarde, o secretário-geral da Liga de Clubes confirmou-me a decisão. Perante esta situação, ponderei sozinho algumas horas e decidi renunciar ao cargo de presidente da Liga de Clubes. Informei os meus colaboradores e solicitei a todos os titulares de cargos nos órgãos da Liga que se mantivessem em funções para manter a normalidade.”
Entrevista a Hermínio Loureiro (Semanário Sol)
E pensar que já houve quem via de bom grado um estreitar de relações entre a AAC e o FCP. Cruz Credo, com essa gente nem pensar!
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